No último dia 11 de junho de 2024, aconteceu em São Paulo um show histórico em comemoração aos 30 anos do Planet Hemp. Há 30 anos, na década de 90, pós-ditadura militar, esses jovens do Rio de Janeiro resolveram fazer o impensável: formar uma banda de rock underground para militar a favor da legalização da maconha. Afinal, não faz sentido uma planta ser proibida, certo? Mas há muito mais por trás disso. Após 300 anos de escravidão, em uma decisão racista, resolveram proibir o chamado fumo de Angola, afinal, "se o pobre começa a pensar, parece que incomoda alguém." Depois de 30 anos de visitas a delegacias, alguns dias na cadeia, shows cancelados e turnês boicotadas por políticos conservadores, parece que os maconheiros mais famosos do Brasil conseguiram LOTAR o Espaço Unimed para a gravação do seu DVD, com capacidade para 8 mil pessoas. Eles também anunciaram a participação de convidados especiais, como Black Alien, BaianaSystem, Pitty, Major RD e Rodrigo Lima, vocalista do Dead Fish. O clima do local já estava ótimo - afinal, a audiência usa "remedinho" para se acalmar tanto quanto a banda. Cheguei cedo, pude explorar o espaço, com uma discotecagem muito agradável que misturava rap com hardcore, ambientando os anos 90. Já prevendo que seria uma noite histórica, entrei na fila do merchandising para garantir minhas lembranças do show. Gastei 330 reais em uma camiseta, um boné e um cinzeiro.
Pontualmente às 21h47, com um cheiro muito agradável no ar, as luzes se apagaram e pudemos ver um cenário encantador: abajures com luz amarela suave, alguns sofás, narguiles, plantas e algumas cabanas. O palco parecia um quintal, o lugar perfeito para receber os amigos e fumar um "negocinho".
O show começou com uma longa introdução, com scratches e remixes de trechos de músicas do Planet Hemp, aumentando a energia da galera. Então, depois de algum tempo, algumas contagens e alguns ruídos de guitarra, percebemos que a introdução havia reiniciado. Os cantores Marcelo D2 e BNegão estavam agitando a galera novamente, até que, após alguma bagunça sonora, a introdução reinicia mais uma vez. A banda ri nervosa, e Marcelo grita no microfone:
"Rapaziada, não estamos conseguindo começar o show, estamos muito nervosos! HAHAH é só fazer o que já fazemos há 30 anos!"
É claro que eu sabia que esse nervosismo tinha alguma relação com o beck enorme que eles fumaram antes de entrar no palco. Eu entendo, porque eu estava da mesma maneira. Aliás, todos ali na plateia estavam. Dava para ver fumaça em todo o ambiente. E não era gelo seco.
Até que, após um discurso inflamado sobre a importância daquela noite, a banda enfim começou a tocar "Jardineiro", hit do último álbum, de mesmo nome. A música foi tocada de maneira perfeita. O som estava ótimo. Agora sim, o Planet Hemp tinha começado o rolé!
Após essa música, que é bem vibe, ligeiramente calma, a banda incendiou a plateia com o riff de "Ex-Quadrilha da Fumaça". "ADIVINHA, DOUTOR, QUEM TÁ DE VOLTA NA PRAÇA? PLANET HEMP - EX-QUADRILHA DA FUMAÇA!!". A plateia começou a pular com uma energia surpreendente e, em seguida, emendaram com "Fazendo a Sua Cabeça", um dos maiores hinos da banda.
Então, chamaram o primeiro convidado da noite, Criolo, para cantar "Distopia", hit do último álbum. Depois de mais músicas novas excelentes, como "Taca Fogo" com Major RD e "Fim do Fim" com Rodrigo Lima, e hinos atemporais clássicos, como "Stab", chamaram outro convidado: Seu Jorge.
De maneira muito elegante, ele apareceu com o black power completamente erguido, óculos escuros e moletom college, e participou da música "Nunca Tenha Medo", com um vozeirão incrível que casou perfeitamente com a música. Eu queria muito que essa versão com Seu Jorge nos vocais estivesse disponível no Spotify.
Na mesma música, Emicida cantou um verso de rap, muito aclamado pelo público. Após isso, na próxima música, totalmente instrumental, Seu Jorge tocou flauta transversal de maneira virtuosa.
Após tanta energia, BNegão anunciou: "CHEGOU A HORA DO NOSSO ROMÁRIO. VEM PRA CÁ, BLACK ALIEN!"
Sim, depois de 30 anos, a formação CLÁSSICA do Planet Hemp estava reunida nos palcos novamente. BNegão, D2 e Black Alien são os três vocalistas dos álbuns de maior sucesso da banda.
Aproveitando a oportunidade, já mandaram "Até a Última Ponta", "Deisdazseis" e "Contexto", para fazer a plateia responder à clássica pergunta: "QUEM É QUE JOGA FUMAÇA PRO ALTO???"
Entrando na metade do show, a banda intercalou alguns sons do último disco com clássicos como "Não Vamos Desistir", "Quem Tem Seda", "Onda Forte" com Kamau, até que D2 pediu para abrir uma roda enorme no meio da plateia, pois eles iam cantar lá no meio.
A equipe então começou a abrir espaço para a montagem de um palco portátil no meio da plateia. Os dois cantores subiram, com muita dificuldade de passar no meio da multidão, e anunciaram que tiveram essa ideia louca de fazer uma roda gigante no meio do Espaço Unimed.
Dito e feito, começaram a tocar a música mais hardcore da banda, "100% Hardcore", e se formou uma roda enorme no meio do salão, com milhares de pessoas pulando e cantando junto.
Depois do pandemônio, o show voltou ao palco principal e anunciou As Mercenárias, após um discurso sobre suas influências. Era uma banda feminina que eu não conhecia, mas ficou clara a admiração da banda principal por elas. Seguindo a ideia de influências, emocionados, chamaram ao palco Mike Muir, o vocalista do Suicidal Tendencies, para tocar um mashup de músicas do Planet Hemp com os californianos. BNegão, em toda oportunidade, explicitou sua admiração pela banda.
Até que foi anunciada uma soteropolitana que tinha uma banda chamada Inkoma: Pitty, que tocou uma versão completamente estilizada e cheia de punk hardcore de Admirável Chip Novo.
Já chegando na parte final do show, emendaram com a clássica Dig Dig Dig. Afinal, "eles um dia vão ver que a lei estava errada" - nada mais contemporâneo do que 2024, onde o STF acabou de descriminalizar o uso da maconha, há menos de um mês atrás.
Então, Marcelo D2 admitiu para a plateia que eles erraram algumas músicas e, como seria a gravação do DVD, eles queriam tocar de novo. Claro, não dava para perder a chance de tocar bonito naquele palco. Mas, para mim, minha saúde de idoso de 28 anos não me permitiu ficar lá em pé com a larica batendo. Agradeci mentalmente pelo espetáculo e me dirigi para a saída para comer um hot dog na frente do Espaço Unimed e ouvir as últimas músicas de lá.
O rolê valeu demais! Tamo junto! Créditos da Capa: @yancarpe
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